quarta-feira, 27 de maio de 2009

Questões sobre Privacidade no Direito Eletrônico



Questões sobre Privacidade no Direito Eletrônico

Os dados cadastrais estão protegidos pelo direito à
privacidade? Em havendo cometimento de ato ilícito ou conduta criminosa, afigura-se justo tornar tais dados inatingíveis?


Resposta:

Entendo que os dados cadastrais dos usuários de internet no Brasil, sejam eles de que tipo for, discada, banda ou de outra modalidade de conexão, as informações cadastrais dos usuários recebem a proteção relativa pela legislação brasileira. Chamo de Relativa, uma vez que a proteção dada pela lei, pode ser revogada para obtenção dos dados cadastrais para fins de instrução em uma investigação administrativa, desde que preenchidos alguns requisitos de admissibilidade e cumpridas algumas formalidades necessárias para casa tipo de caso.

O direito à intimidade, assim como os demais direitos fundamentais, não é absoluto, e deve ceder o mínimo necessário quando concorrer com outros direitos e princípios constitucionais, de forma a se alcançar uma harmonização, sem supressão de qualquer deles, já que não existe, dentro da constituição, hierarquia entre os direitos e princípios explícitos e implícitos. Na hipótese, o confronto estabelece-se entre o direito à intimidade e a garantia de entrega da Justiça, amparada no Princípio da Proteção Judiciária.

Temos portanto, ao momento da geração do cadastro do usuário, a elaboração de uma ficha cadastral que recebe a proteção de seu conteúdo pela Constituição Federal em seu artigo 5º, incisos X e XII, igualmente tutelada pelo Código de Defesa do Consumidor e pelo Código Civil de 2002.

Porém o que deve ser separada é a conceituação dessa proteção dada pela lei. Jamais devemos confundir a proteção dos dados com a proteção à intimidade. Os DADOS podem ser solicitados à autoridade que os mantém sob guarda, mediante requerimento fundamentado pela Autoridade Investigativa.

O que é protegido é a comunicação 'de dados' e não os 'dados', pois isso tornaria impossível qualquer investigação administrativa, seja ela qual fosse.

Em CASO DE OCORRÊNCIA DE ATO ILÍCITO ou DE CONDUTA CRIMINOSA, conforme já dito anteriormente, deve-se tomar muito cuidado com a busca das informações junto ao Provedor. Se as formalidades não forem obedecidas pela Autoridade Investigativa, corre-se o risco de transformar todas as PROVAS e EVIDÊNCIAS obtidas através do procedimento irregular em PROVAS ILÍCITAS inaptas e condenadas ao uso em um processo judicial.

Além de observar a questão da Privacidade que sempre mantém uma linha muito estreita com a da Intimidade. Entendo que o fornecimento do cadastro do usuário pelo provedor de acesso, com forma segura de identificar o autor de um crime pelo meio eletrônico, não fere o direito à privacidade ou o sigilo das comunicações, visto que se trata apenas da qualificação do usuário, e não do conteúdo de suas mensagens enviadas.

A respeito do assunto, cabe mencionar o estudo de Tércio Sampaio Ferraz Júnior em seu
trabalho "Sigilo de Dados: O Direito à Privacidade e os Limites à Função Fiscalizadora do Estado’, ao explanar sobre o alcance da proteção à vida privada:

"Pelo sentido inexoravelmente comunicacional da convivência, a vida privada compõe, porém, um conjunto de situações que, usualmente, são informadas sem constrangimento. São dados que, embora privativos — como o nome, endereço, profissão, idade, estado civil, filiação, número de registro público oficial etc, condicionam o próprio intercâmbio humano em sociedade, pois constituem elementos de identificação que tornam a comunicação possível, corrente e segura. Por isso, a proteção desses dados
em si, pelo sigilo, não faz sentido. Assim, a inviolabilidade de dados referentes à vida privada só tem pertinência para aqueles associados aos (Revista da Faculdade de Direito USP,vol. 88, 1993, p. 449), elementos identificadores usados nas relações de convivência, as quais só dizem respeito aos que convivem.

Dito de outro modo, os elementos de identificação só são protegidos quando compõem relações de convivência privativas: a proteção é para elas, não para eles. Em conseqüência, simples cadastros de elementos identificadores (nome, endereço, R.G.,filiação, etc.) não são protegidos. Mas cadastros que envolvam relações de convivência privada (por exemplo, nas relações de clientela, desde quando é cliente, e a relação foi interrompida, as razões pelas quais isto ocorreu, quais os interesses peculiares do cliente, sua capacidade de satisfazer aqueles interesses, etc) estão sob proteção.

Afinal, o risco à integridade moral do sujeito, objeto do direito à privacidade, não está no nome, mas na exploração do nome, não está nos elementos de identificação que
condicionam as relações privadas, mas na apropriação dessas relações por terceiros a quem elas não dizem respeito”.

Não é demais evocar a jurisprudência emanada da Corte Suprema brasileira, em especial o trecho do voto proferido pelo Ministro Sepúlveda Pertence, que também dá
amparo ao acolhimento da ordem pleiteada:

"Não entendo que se cuide de garantia com status constitucional. Não se trata da 'intimidade ' protegida no inciso X do art. 5º da Constituição Federal. Da minha leitura, no inciso XII da Lei Fundamental, o que se protege, e de modo absoluto, até em relação ao Poder Judiciário, é a comunicação 'de dados' e não os 'dados', o que tornaria impossível qualquer investigação administrativa, fosse qual fosse."(voto
proferido no MS n. 21.729-4/DF,DJ 19.10.2001).

Não há falar, nesses termos, em ofensa à soberania nacional ou à ordem pública, eis que, como bem ressaltado pelo Ministro Sepúlveda Pertence no voto acima, pela interpretação da garantia estampada no art. 5º, X e XII da CF/88, veda-se a quebra do
sigilo da comunicação dos dados, não do conhecimento dos dados em si.

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